segunda-feira, 28 de junho de 2010

A lila de deus

Para os Hindus, a vida é feita de uma matéria chamada alegria, chamada de a Lila de Deus. Para eles, tudo brinca no universo. Tudo são sons de alegria e vida. As borboletas que giram no ar brindando à criação universal, os pássaros cantando, as árvores bailando ao vento, as estrelas cintilando, as nuvens esvoaçando e toda criação festejam a vida ao doce som de uma flauta.

E nós seres humanos? Festejamos também a vida? Nós, tidos como o pico da criatividade universal, estamos celebrando a vida?

Sim, festejamos. Nossas festas religiosas, nossas festas sazonais, nossas festas de aniversário, nossas comemorações esportivas, etc, demonstram isso.

No entanto, ainda não aprendemos a festejar, a nos alegrar pelo simples fato de estarmos vivos, apreciando e partilhando este fabuloso espetáculo chamado vida. Ainda não festejamos sem motivo algum aparente este espetáculo. Ainda precisamos de motivos exteriores a nós mesmos para sentirmos a alegria ou felicidade, ainda precisamos alterar nosso estado de consciência nos utilizando de bebidas alcoólicas ou outras drogas para alcançarmos o prazer de viver. Ainda é rude nossa forma de celebrar a vida a ponto dessa celebração muitas vezes se situar bem na fronteira da dor.

A alegria sutil, a alegria meditativa, a alegria que vem de dentro de nós mesmos, aquela que não possui procedência definida, aquela alegria que está em nós e que repentinamente nos toca sem motivo algum, mas pelo simples fato de existir dentro de nós, esta alegria inerente aos pássaros que cantam para festejar a existência ou das flores que simplesmente exalam seu perfume para ninguém em especial, a alegria das nuvens que brincam nos céus ou de um bebe que simplesmente sorri para a vida sem nada pedir em troca; essa alegria inocente que simplesmente brota de nenhum lugar definido é que precisamos deixar florescer dentro de nós espontaneamente como forma de agradecimento pela existência.

A alegria que chega de um estado de consciência meditativa, que parte de dentro para fora, que chega devido ao deslumbramento pelo que existe, esta alegria que existe sem motivo algum ainda precisamos aprender a vivenciar.

segunda-feira, 21 de junho de 2010

Uma oportunidade para mudar

Por paradoxal que seja estamos passando por um momento muito instrutivo neste nosso Brasil. Enquanto são denunciados centenas de casos de corrupção ativa e passiva em todas as esferas da vida política e social do país, a população, pasmada, vai tendo seu aprendizado e vendo o quanto é necessário estar alerta para não se ver roubado por aquilo que se convencionou chamar de “esperteza brasileira”ou “jeitinho brasileiro” tido mesmo como característica de nosso povo.
Já o ex-antropólogo, ex-senador da república e ex-indigenista Darci Ribeiro, nos falava da tendência histórica dos donos do poder no Brasil, em misturar as esferas pública e privada desde os tempos da colonização.
Os Capitães Donatários tinham do país, uma idéia de ser este seu próprio quintal e como eram chefes políticos, também eram os donos da máquina administrativa montada para gerir o país. Disto derivou o “apadrinhamento político”; os aliados que do Estado tudo receberiam em troca da lealdade em todos os sentidos.
Este atavismo se encontra até hoje espalhado por todo o país, mas, sobretudo, no nordeste brasileiro, onde mais se arraigou o chamado coronelismo, prática espúria e peçonhenta, devido ao abandono a que esta região se viu submetida desde quando o açúcar deixou de ser a principal fonte de renda do Estado.
Espalhou-se por todas as camadas sociais esta prática que deforma o caráter desde o guarda de transito até os mais altos cargos da república com a prática do “molha minha mão” que eu faço.
A população vê estupefata a onda corrupta acontecendo neste momento no país e eu rezo para que sinceramente a apatia a que foi lançada desde o golpe militar de 1964 e particularmente os jovens que tiveram na qualidade de sua educação a mais brutal despolitização, estejam realmente absorvendo os ensinamentos e aprendam a se indignar contra esta tão melancólica prática brasileira.
Não há mais possibilidade hoje, de vivermos em um mundo globalizado tendo posturas que correspondam a séculos passados. O mundo mudou, a população cresceu muito, o problema da fome e do meio ambiente se agravaram por mil vezes e não é tendo práticas concernentes a épocas pretéritas que resolveremos as questões que afligem a humanidade dos dias que correm. Ou nós nos transformamos interiormente, mudando o nosso foco de observação da vida, ou as chances de sobrevivência da raça humana será nula. .

terça-feira, 15 de junho de 2010

Amar o lugar onde vivemos como a nós mesmos

É preciso olhar o lugar onde moramos com os olhos do amor; olhar que sai do mais fundo de nosso coração.
Normalmente olhamos o lugar onde vivemos com os olhos da “carteira”, do “bolso”, da economia, das estatísticas, da ambição, daquilo que o lugar possa oferecer e não naquilo que podemos oferecer ao lugar, no que podemos fazer para torná-lo mais bonito e melhor para viver, e isto retira nossa capacidade de enxergar a beleza que reina nesses lugares.
Esta atitude nos afasta da natureza, nos impede de perceber a teia de relações existenciais que nos cerca. Isolamo-nos, alienamo-nos do meio ambiente e vivemos apenas a teia das relações sociais.
Acontece que essa visão é estreita, cativa, porque não percebe que nossa existência enquanto humanidade não se esgota em nós mesmos. Muito pelo contrário, a cada dia aprofundamos nossa dependência dos reinos animal, vegetal e mineral porque a produção das coisas que tanto desejamos enquanto agentes sociais consumidores provem da matéria prima desses reinos. Só que nossa alienação do processo produtivo é de tal monta que não conseguimos enxergar nas coisas que compramos sua origem.
De onde provem tal ou qual objeto? Como foi produzido? O que foi necessário fazer para tal ou qual produto chegar às nossas mãos?
Essas perguntas não ecoam em nossas consciências porque nos acostumamos aos produtos finais. Não nos interessa de onde ou como foi produzido, o que importa é que esteja em mãos. Não importa o que foi preciso fazer para que o produto esteja a minha disposição. Não importa como foi extraída da natureza a matéria prima para fazer o que tenho em mãos, não importa o desgaste ou o sofrimento que causou, o que importa é minha satisfação fugaz.
Não mais construímos nossos brinquedos, não fazemos nossa comida, não construímos nossa casa e nem nossa cidade. Não temos mais vínculos com o processo de criação mas tão somente com o objeto final que logo se transformará em lixo.
O vinculo com as coisas se estabelece quando temos consciência de seu processo de produção. Como ele é feito? Assim também se dá com relação ao amor que podemos ter com as cidades onde moramos. Como ela surgiu? De onde vieram seus fundadores? Qual sua história? São perguntas que criam vínculos, criam respeito e abrem as portas da percepção para ver melhor a maneira como podemos melhorar o espaço da cidade onde habitamos. Olhar com olhos amorosos e profundos o lugar onde vivemos observando a teia de relações que estabelecemos com a vida fora de nós é um processo de desalienação e transformador para com nossa cidade e para conosco mesmo.
Pense nisso!

sexta-feira, 11 de junho de 2010

Fragmento do livro "A Iniciação Diário de uma Viagem à Índia" de Dhyan Firdauz

“...Havia quatro covas e em uma delas se depositou madeira seca, sobre a qual colocaram o estrado com o corpo, cobrindo-o em seguida com mais lenha seca de maneira que ficou totalmente coberto. Um combustível foi derramado e um palito de fósforo foi riscado e lançado sobre a madeira. O fogo foi aceso. Nesse momento se fez um grande silêncio. Uma imensa chama subiu e o fogo passou a arder devorando aquela madeira e consumindo aquele corpo. O cheiro quase imperceptível de carne sendo cremada era levado pelo vento em direção ao rio, enquanto familiares, amigos e centenas de sannyasins recomeçavam a cantar e dançar ao som daquele ritmo frenético tocado pelos músicos, festejando a passagem do ente querido para um novo estágio da vida, talvez mais próximo de Deus.
O cansaço foi tomando conta de todos e lentamente começaram a se retirar seguindo cada qual a sua direção, até que por fim a música cessou por completo e todos se foram. Eram por volta das 17h30min daquela estranha tarde quando também me retirei do local indo em direção ao meu quarto. O fogo ainda consumia toda aquela lenha e o corpo da sannyasin. Fagulhas subiam em direção ao céu e pássaros sobrevoavam o rio. A praça agora estava deserta e nada mais restava a não ser uma fogueira consumida para bem mais da metade.
No caminho para meu quarto fui pensando na beleza daquele ritual de despedida feito por aquele povo; fui pensando na brevidade da vida aqui na terra e na imortalidade da alma. O mundo ocidental valoriza enormemente o que é perecível e superficial e esquece-se do que é permanente e essencial.
No dia seguinte pela manhã voltei ao local e cinzas ainda quentes denunciavam a cremação do corpo do dia anterior.”

quinta-feira, 3 de junho de 2010

Nós, vendedores

Existem no mundo, vendedores de produtos de toda ordem. Por exemplo, existem os vendedores de cosméticos ou os vendedores de armas, o vendedor de roupas ou o de sapatos; existem os vendedores de sonhos ou ilusões lançadas a esmo no ar. Existem os vendedores de drogas de toda ordem, cigarros, café, ou açúcar; cocaína, maconha ou álcool. Existem até os vendedores de luares nos encantadores saraus.

Existem os vendedores de angústia que pregam as vaidades impossíveis ou os amores eternos. Existem os que vendem os tons e os dons de nossa época tão rápida que logo dão passagem para outros que passam muito rápido também. Existem os vendedores de alma que a entregam por qualquer ninharia oferecida na vã esperança de conseguir felicidade. Existem os vendedores de tudo porque tudo é passível de compra, de venda ou de troca.

O fato é que corre no sangue da humanidade a compra e a venda, a troca, porque é do gênero humano o relacionar-se.

Eu, no entanto, me coloco como um vendedor de felicidade. A felicidade de estar aqui, de ser daqui, e de poder, vez ou outra, desprender-me de mim mesmo e voar por ares nunca dantes navegados; felicidade de me saber eterno a me buscar, experimentar ser humano.

Coloco-me como vendedor de felicidade por poder fechar os olhos e tocar na luz que fica lá nas camadas mais profundas de mim mesmo e rejuvenescer; por poder ir e voltar a qualquer lugar porque lá ficou uma paixão, ficou uma dúvida e, sobretudo, porque nasceram perguntas. Sou vendedor de felicidade porque a reconheço vivendo de mãos dadas com meu coração. Reconheço-a aqui e agora e sei das várias faces que possuem e sei também que todas são felicidade. Vendo a possibilidade de simplesmente sentar, fechar os olhos e nada fazer a não ser sentir o puro deleite que é o de me saber gente que sou.