segunda-feira, 30 de junho de 2008

A NAMORADA



“Sonhar o sonho verdadeiro não é apenas deixar a imaginação ir-se solta pelo ar a perder-se por entre as nuvens de outros sonhos em diletante sonhar. Não! Sonhar o verdadeiro sonho é transformar o objeto de nosso desejo em caminho a caminhar até a exaustão. É traçar rota, a melhor possível, para a materialização do sonho sonhado. Um sonho é uma esperança, uma idéia, é éter, vapor e pode diluir-se no momento seguinte em frustrações, ansiedades e cansaço. Sonhar assim, não é ter bons sonhos, é desperdiçar energia e acordar cansado, muito cansado de sonhar.”
Diego leu o texto novamente e fez uma pausa para reflexão. Olhou para o teto decidido e em seu olhar via-se firmeza, muita convicção e coragem. O coração sangrou de vontade. Era o que precisava fazer. Arriscar. Era preferível a continuar do jeito que estava. E o caminho ele sabia qual era. Ali, perto de sua casa, a algumas quadras. O problema todo era ter coragem para enfrentá-lo. Ergueu-se da cama e saiu porta a fora. Os passos eram seguros, firmes, diria até, másculos. Dobrou a esquina da Rua Esperança e encaminhou-se para a casa dela. O dia cheio de sol lhe dava vigor, o sopro do vento fazia seus cabelos encaracolados balançarem dando-lhe aquele frescor de juventude. Ainda distante o percebeu varrendo o pátio. Ele, todo autoritário, dono do mundo e de suas possessões. Um rei em seu pequeno feudo. A barriga proeminente, coberta por uma camisa caseira, debruçava-se por cima da bermuda vermelha e deixava apenas levemente se perceber o grosso cinturão que usava. Aquele fivelão dos anos setenta. A barba por fazer e o cabelo desgrenhado aumentava-lhe ainda mais o aspecto arrogante de brutamontes. A impressão que Ele passava era de que varria o pátio na esperança de que alguém viesse lhe dizer alguma chacota sobre o trabalho caseiro que fazia para violentamente pular no pescoço do gracioso e lhe aplicar vários safanões. A vassoura em suas mãos mais parecia uma arma em vez de um instrumento de limpeza.
Diego tremeu nas bases mas não recuou. Foi em frente. E a cada passo que dava seu coração acelerava-se ainda mais. Batidas violentas, o coração ia pular pela boca. O suor começou a escorrer pelo corpo. Os olhos fixos como de um autômato. Foi atravessando a pequena praça que o separava de seu objeto de desejo. Passou o primeiro banco fixado em frente a uma pequena árvore e logo após o outro que estava fixado mais adiante e onde ele alguns dias atrás a viu pela primeira vez. Estava sentada, linda, os olhos apontados para o céu que viam nuvens transformando-se ora de um peixe para um carneiro, ora de um homem para um elefante. Apaixonou-se a primeira vista. Aproximou-se dela, os olhares se tocaram e começaram a conversar. A conversa transformou-se em namoro as escondidas, em pequenos e rápidos encontros furtivos. E agora ele queria sair com ela mais livremente. Queria poder abraçá-la, levá-la ao cinema, sair com ela, passear de mãos dadas. Mas o pai, oh, o pai. Ela o dizia muito brabo, difícil de lidar. Pouco conversava com ela que não tinha coragem para lhe contar a cerca do namoro. Ele estava decidido a encará-lo, ir a sua casa e pedir para livremente namorar a filha. Ele quinze anos, ela catorze. Olhou mais uma vez para aquele homem, sentiu um calafrio e atravessou a rua em sua direção. O coração disparou, tropeçou em alguma coisa inexistente, suou frio, mas levantou a cabeça e com uma força que não sabia de onde vinha falou para o homem:
-Bom dia, posso falar com o sr.um instante?
-Sim, o que deseja?
-Meu nome é Diego e sou estudante. Conheci sua filha e gostei dela, ela gostou de mim. Queria que o sr. deixasse a gente namorar. Falou assim franca e secamente.
Ele olhou para o rapaz com os olhos claros e tranqüilos e puxou um pouco a bermuda que apesar do cinto, ameaçava cair. Apoiou-se no cabo da vassoura. Diego imaginou que ia levar uma vassourada na cabeça. Tremeu um pouco por sua ousadia.
-Angélica! Gritou o pai lá para dentro da casa.
-Quer dizer que o sr. quer namorar a minha filha? Perguntou o homem.
-Sim, respondeu Diego, com a garganta seca como se estivesse há dias atravessando o mais seco dos desertos.
Angélica chegou à porta e quase tem um desmaio quando vê Diego na porta de sua casa. O rosto pálido parecia um melão maduro. Parecia que ia desmaiar. Os olhos titubearam, uma mancha lilás apareceu em frente a sua vista.
-Angélica, disse o pai, este rapaz veio aqui para pedir para namorar você. O que você tem a me dizer?
A voz por um segundo desapareceu. Olhou para Diego que apesar da paralisia conseguiu dar uma piscada com o olho esquerdo em sua direção. O coração palpitou, a voz conseguiu soltar-se da garganta, e disse:
-Só tenho a dizer que gosto dele sim, pai. Posso namorar ele?
E a resposta do pai foi simples, direta e estonteante para ambos:
-Sim, não há problema. Pode entrar rapaz.

Dhyan Firdauz

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